terça-feira, 24 de setembro de 2013

II Ciclo de Conferências Socialismo e Educação. Mesa 1, parte 1.


Assista à primeira conferência do II CCSE,  realizada no dia 19 de agosto de 2013, pelo youtube:

Parte 1: Apresentação e Antônio Júlio Menezes Neto (UFMG)

http://www.youtube.com/watch?v=pK91bEf6dBk


Parte 2: Paulo Denisar Fraga (UNIFAL-MG)

http://www.youtube.com/watch?v=gLalHxF7hTQ


Parte 3: Marcos Del Roio (UNESP)

http://www.youtube.com/watch?v=nb150ujPPMM


Parte 4: Debate com o público

http://www.youtube.com/watch?v=L7C_bR_y1tI

segunda-feira, 12 de agosto de 2013



quinta-feira, 20 de junho de 2013

O Brasil sai às ruas


Todos os brasileiros estão acompanhando a onda de manifestações nas ruas por meio da grade mídia, de redes sociais e em debates com organizações políticas e movimentos sociais. 

As grandes manifestações de massa, com milhares de pessoas, constituem um processo social que conjuga o velho e o novo. Por um lado, o ato de protestar no Brasil se sustenta em uma longa história de rebeldia e de luta pela liberdade que vem desde, pelo menos, o início da colonização, com as revoltas de indígenas e africanos escravizados. Durante os últimos 500 anos foram inúmeras as revoltas, insurreições, rebeliões, revoluções e outros tipos de lutas sociais realizadas por nossos ancestrais. Nas últimas décadas o Brasil teve dois grandes momentos de levante de massas: 1985, com a luta pelas eleições diretas, o Movimento Diretas Já!; e 1992, durante o protesto contra o primeiro presidente eleito diretamente após a Ditadura Militar (1964-1985), por denúncias de corrupção, com o Movimento Fora Collor. 

O principal sujeito da atual onda de manifestações pelo Brasil é a juventude. As manifestações que neste momento estão ocorrendo no Brasil são as manifestações desta atual geração de jovens que não viveram o Fora Collor, com entre 15 e 25 anos de idade, aproximadamente 35 milhões de brasileiras e brasileiros. Uma juventude de estudantes secundaristas e universitários, que nunca antes havia tomado as ruas ou vivido um processo de manifestação popular. Uma juventude sem orientação partidária, de direita ou esquerda, e que está aprendendo o que é uma manifestação na prática.

Podemos afirmar que perguntar "que forças articulam este movimento", é não compreender o que está acontecendo no país. Existem organizações ("forças") que também estão saindo às ruas, e vão desde grupos de esquerda, partidos e movimentos sociais que são "velhos de rua", passando por grupos anarquistas, grupos de direita, até torcidas organizadas de futebol. 

Porém, em termos de país, nenhum desses grupos tem hegemonizado os protestos de rua. Em casos específicos e locais, sim, há grupos que hegemonizam, como muitas manifestações puxadas por grupos de direita em cidades do interior. 

Trata-se, por um lado, da chegada ao Brasil de uma série de ondas de protestos de massa que se iniciou em 2011 no Norte da África, a chamada Primavera Árabe, e que tem eclodido nos países da Europa em crise (principalmente Grécia, Espanha e Portugal), e que nos EUA se chamou Occupy Wall Street (Nova York e outras cidades americanas). Este ano foi a vez da Turquia e, agora, do Brasil.

O padrão da Turquia e do Brasil é muito parecido: uma manifestação localizada é duramente reprimida pela polícia. As imagens da repressão ganham a internet e funcionam como convocatórias para outras manifestações. O movimento cresce e as pautas também. O que na Turquia era uma reação de defesa de um parque vira um protesto contra o governo. No Brasil, o que era uma manifestação contra o aumento do transporte público, ganha pautas mais difusas.

No caso no Brasil, o contexto da Copa das Confederações serve de momento privilegiado para o protesto, pois há uma disseminada indignação sobre os gastos com estádios, a FIFA e as empresas patrocinadoras. O caso de Brasília é bastante emblemático: uma cidade sem tradição de futebol, sem grandes times, onde é construído um estádio inicialmente orçado em 700 milhões e atualmente custando mais que o dobro, 1,5 bilhões de reais. Todos os brasileiros sabem que será um estádio pouco utilizado depois da Copa. Assim se gera uma indignação geral, pois enquanto há muito dinheiro para a copa, não há dinheiro para a educação, saúde, transporte público. E é isso que o povo tem gritado nas ruas, sem carros de som.

A grande difusão das redes sociais colocou jovens de diferentes classes sociais em contato. Acontece que a juventude decidiu sair do facebook e experimentar as ruas. A lógica que percebe-se é que, se o poder político é sedutor e atraiu muitos antigos militantes sociais para gabinetes e para a gestão do Estado, o poder das ruas é muito atraente para a grande maioria da população que está alijada da participação nas decisões.

Assim, o sujeito histórico nas ruas é o povo, e o povo com uma maioria da trabalhadora, assim como pessoas de classes burguesas, muitos militantes de organizações de esquerda, e alguns líderes de torcidas organizadas e militantes de direita.

Neste cenário, o lugar de quem tem experiência de movimentos de massa, dos históricos militantes de esquerda, é nas ruas. Um dever pedagógico de contribuir para que este movimento não seja apropriado pela direita, e nem pelo governo. Foi interessante o pronunciamento da Dilma no dia 18 de junho. Ela praticamente disse que estará nas ruas manifestando também! Parece não entender que um dos principais alvos dos protestos é o governo federal e suas prioridades.

A velha política do pão e circo - aqui corporificada nas bolsas e copas - encontra momentos difíceis e inesperados. Os poderosos torcem para a onda passar logo, mas há o risco de o povo gostar e insistir até que haja resultados. 

Especificamente, a redução dos preços dos transportes públicos pode acalmar as massa. Alguma prefeituras de capitais já anunciaram isso.

É interessante observar ainda que temos um novo tipo de meio de comunicação e mobilização (redes sociais) que está sendo usado para o povo sair às ruas e reivindicar as demandas mais clássicas da história moderna e pós-moderna: investimentos em saúde e educação e combate à corrupção. 

Analisando a situação alguns pontos chamam a atenção:

1) Ninguém vai dizer que é contra investimentos na saúde e educação. E ninguém vai dizer que é contra o combate à corrupção ou que é favorável à corrupção!. Nenhum governante, e nenhum manifestante. Mas isso não invalida o fato de realmente existirem desvios de dinheiro público em várias áreas do Estado no Brasil, problema que continua e que gera indignação. 

2) Esses temas clássicos continuam problemáticos para a grande maioria da população em seu dia a dia. Isso é real: problemas na áreas da saúde, educação e administração pública. Problemas na saúde (saúde pública precária, domínio dos planos de saúde, formação de médicos, prevenção), problemas na educação (baixos salários dos professores, precariedade da infra-estrutura escolar dos municípios e estados, falta de políticas públicas de estados e municípios para a educação do campo), e denúncias de corrupção e mal uso de recursos públicos são realidades da vida dos brasileiros. 

Em 10 anos o governo federal do PT realizou alguns importantes avanços no atendimento às demandas sociais, mas não foi capaz de enfrentar de modo amplo e eficaz os problemas clássicos da saúde e educação. Talvez pela própria estrutura do Estado brasileiro. Talvez por causa de máfias implacáveis que estão no poder de setores do Estado há décadas. Talvez por causa de uma falta de vontade e de projeto de mobilização popular.  

E a cereja do bolo, ou a gota d'água, é a Copa das Confederações e a Copa do Mundo. Vivemos no dia a dia uma falta de saúde pública, problemas na educação pública e crises de corrupção que não levam à prisão dos condenados. Enquanto isso, há tanto dinheiro para a copa, o que significa dinheiro para os empresários de grupos que gerenciam estádios privatizados, e empresários da Coca-cola, da Nike, da Globo, da AmBev, e outras multinacionais imperialistas, muitas yankees. 

Independente do que vier no futuro, o que assistimos hoje é o maior movimento popular da nossa história recente. E motivos para o protesto não faltam: judiciário moroso e que favorece as classes ricas, serviços públicos de baixa qualidade, distanciamento dos representantes políticos, gastos excessivos com as Copas, privatização de portos, aeroportos e rodovias, ingressos muito caros para os jogos das copas, insegurança pública, falta de infra-estruturas para as chuvas, empresas de celular ineficientes, indústria da seca no nordeste, a construção de Belo Monte, conflitos entre fazendeiros e indígenas, racismo institucional, homofobia, violência contra a mulher, etc., etc., 

Ou seja, surpreendente era o quadro antes das manifestações: como um povo trabalhador tão explorado, em um país com tantos problemas, mas, ao mesmo tempo, com tantos recursos e possibilidades, não saia às ruas? De certo modo, as manifestações representam a restauração da lógica entre nós, brasileiros! Somos nós, como massa humana nas ruas, lembrando a nós mesmos que nosso poder como massa humana, existe e é imbatível. 

Neste momento é necessário que todas as organizações da esquerda socialista, que estão sempre nas ruas, participem do movimento de massa com firmeza, unidade e solidariedade, diferenciando-se, perante a população, dos partidos da ordem burguesa e de grupos de direita fascistas, e contribuindo para a educação popular da juventude que está nas ruas.

Em experiências de assembléias de rua os manifestantes tem colocado suas reivindicações. Basicamente exigem direitos há 25 anos garantidos pela Constituição mas que não são respeitados a uma grande parte da população em seu dia a dia. Saúde, educação e transporte públicos de qualidade.


Esta foto de São Paulo mostra os estopins, ou imagens de atos que levaram a uma comoção nacional e serviram de convite às ruas: um PM bate com seu cacetete nas costas de uma mulher, que cai sobre um homem no chão.A mulher está no ar, recebendo o golpe. E a fisionomia do PM que a agride, ao ser observado por outros PMs, expressa um sentimento de ódio e truculência. Ao fundo uma mulher com as mãos sobre a boca parece estupefata pelo que vê, com um princípio de indignação. E ao fundo, à esquerda, outra mulher aponta uma câmera para a cena, registrando-a em video, que depois será postado nas redes sociais e assistido por milhares de outras pessoas, potencialmente em todo o mundo, contribuindo para a disseminação das representações audio-visuais dos protestos e como convite à participação popular.

domingo, 9 de junho de 2013

O que a mídia não conta acerca da explosão social na Turquia - por LibreRed

Um dos argumentos mais utilizados pelos grandes meios de comunicação ocidentais quando se trata de interpretar a origem da explosão social nas ruas da Turquia é a deriva islâmica e autoritária do governo de Recep Tayip Erdogan.

Deste modo, os mass media centram toda a atenção na disjuntiva islamismo-laicismo e autoritarismo-democracia, fazendo uma análise simplista e parcial da realidade que vive estes dias o país euro-asiático.

Mas para analisar com maior profundidade a recente revolta popular nas ruas de cidades como Istambul ou Ancara seria preciso adoptar outra perspectiva e por a lupa nas políticas sócio-económicas que o executivo tem desenvolvido nestes últimos anos.

O governo de Erdogan, integrado pelo Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), chega ao poder no ano de 2002 num contexto de crise económica (crise financeira de 2001) onde acorda um programa de medidas de feitio claramente neoliberal com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que passam pela privatização do sector público, reformas laborais e drásticos cortes sociais.

Um ano depois de chegar ao governo, em 2003, é aberto o caminho à privatização da empresa pública de telecomunicações Turk Telekom [1] . No ano seguinte, 2004, põem-se à venda companhias de bebida, fábricas de aço e a as Linhas Aéreas Turcas [2] .

Desde então, inicia-se um processo que não tem marcha-atrás. Em 2007, dá-se sinal verde à privatização da empresa pública de tabacos da Turquia, Tekel [3] . Em 2008, é a vez da rede eléctrica, com a venda de duas companhias de distribuição em Ancara e Sakarya-Kocaeli [4] . Além disso, nesse mesmo ano anuncia-se a venda de banco de propriedade estatal Halkbank e a privatização de 15 por cento das acções da Turk Telekom.

Em 2009, o governo aprova legislação para conceder a água dos rios, dos lagos e das albufeiras às corporações privadas. Isto significa que os recursos hídricos podem ser transferidos a corporações, que até então controlavam só os serviços de distribuição [5] .

Diante disto, a Confederação dos sindicatos camponeses turcos, Çiftçi-Sen, juntamente com mais de 100 outras forças de oposição social que defendem o reconhecimento do direito à água, constituem uma plataforma chamada "Não à comercialização da água" e manifestam-se maciçamente em 15 de Março de 2009 em Istambul no âmbito do Fórum Mundial da Água [6] .

Em 2011, o governo de Erdogan inicia as negociações para a privatização [7] de 2.000 quilómetros de auto-estradas e pontes do país. Desta maneira o executivo turco pretende ceder ao capital privado até nove rodovias com portagem e duas pontes sobre o Bósforo, vias de comunicação muito importantes na área de Istambul.

Através da chamada "Administração de Privatizações" (OIB na sua sigla em turco), Erdogan procurar fazer avançar um pacote de privatizações no país que inclui o têxtil, a mineração, o petróleo, a alimentação e o transporte marítimo, dentre outros sectores [8] .

Em Fevereiro desse mesmo ano, 10 mil pessoas manifestam-se no centro de Ancara em repúdio à reforma laboral do governo que, entre outras medidas, inclui a redução do salário mínimo para os jovens, a possibilidade de transferência dos funcionários e permite a contratação de empregados sem seguro social [9] .

Muitos dos presentes à manifestação gritam em coro: "Isto é Ancara, não o Cairo", "Tayyip, chegou a sua vez" e "Tayyip, te desejamos um final [tão] feliz como o de Mubarak".

As directrizes neoliberais aplicadas durante estes últimos anos geraram um aumento da desigualdade social no país. Segundo a revista Forbes, em Istambul, capital financeira da Turquia, havia um total de 35 multi-milionários em Março de 2008 (em comparação com 25 em 2007), situando-se em 4º lugar no mundo. Um relatório para empresários interessados em investir na Turquia elaborado pelo banco espanhol Banesto assegura que "o país está marcado pela existência de fortes desigualdades de rendimento" [10] . Muitos empregados na Turquia não ganham mais que o salário mínimo de 570 dólares e o rendimento per capita é quase a metade dos rendimentos médios europeus.

Talvez este conjunto de factores ajude a explicar o mal-estar social que deu origem aos distúrbios hoje vividos na Turquia, para além do enfoque liberal que a imprensa do Ocidente pretende dar dos mesmos.

Referências: 
[1] elpais.com/diario/2003/11/12/economia/1068591610_850215.html
[2] spanish.peopledaily.com.cn/spanish/200402/12/sp20040212_72471.html
[3] www.icex.es/...
[4] www.hispanatolia.com/...
[5] www.tni.org/
[6] www.eurovia.org/spip.php?article67&lang=fr
[7] www.cincodias.com/... as/turquia-inicia-privatizacion-2000-kilometros-autopistas/20110830cdscdiemp_16/
[8] www.oib.gov.tr/index_eng.htm
[9] http://www.abc.es/agencias/noticia.asp?noticia=677519
[10] comercioexterior.banesto.es/... 

CURSO DE FORMAÇÃO POLÍTICA TEM INÍCIO EM JUIZ DE FORA




No sábado, dia 8 de junho de 2013, ocorreu a primeira sessão do curso de formação política do PCB em Juiz de Fora. O local foi a faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora. O público presente que chegou a 40 pessoas era composto por estudantes secundaristas e universitários bem como militantes da cidade de Juiz de Fora e região. O Prof. Pablo Lima, membro do ICP-MG, foi o responsável pela apresentação que orientou o debate, que foi o Socialismo pré-marxiano, a partir de um texto do historiador marxista britânico Eric Hobsbawm. Este autor lembra que o pensamento de Marx e Engels tem suas raízes na filosofia alemã, nos movimentos sociais franceses e na dinâmica econômica britânica. Esta foi apenas a sessão inicial do curso de formação política organizado pelo PCB de Juiz de Fora.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Caio Prado Jr. e o Comunismo

Caio Prado Júnior (1907-1990) foi um intelectual marxista, com uma longa trajetória de atuação no PCB. Filiou-se ao partido comunista em 1931 e em pouco tempo destacou-se como dirigente político, nesta época atuando principalmente na Aliança Nacional Libertadora (ANL), espécie de frente de oposição ao governo de Vargas lançada em 1935. Com a eclosão, neste mesmo ano, da Intentona Comunista (tentativa de revolução liderada pelos comunistas), Caio Prado Júnior foi preso, ficando na prisão de 1935 a 1937. De onde parte para viver a II Guerra Mundial na Europa.
Com fim da ditadura de Getúlio Vargas, Caio Prado volta à política e é eleito deputado estadual pelo PCB para a Assembleia Legislativa de São Paulo, em 1946, porém, no ano seguinte, seu mandato é cassado, em virtude do Partido Comunista ter sido colocado na ilegalidade pelo governo Dutra (1946-1951), obedecendo com isso às imposições dos Estados Unidos, que dava início as hostilidades da Guerra Fria.
Durante os anos 1950 e 1960, Caio Prado Júnior procurou, em sua atuação no interior do PCB, combater a teoria e a prática tão difundida entre os comunistas da época de que a revolução no Brasil ainda teria um “caráter democrático-burguês”, ou seja, segundo o entendimento do PCB naquela época, a luta no Brasil ainda não era pelo socialismo, mas sim por uma revolução contra o latifúndio e contra o imperialismo, que o operariado deve levar a cabo numa aliança com a burguesia nacional.
A estratégia do PCB baseava-se uma leitura da História do Brasil segundo a qual o país ainda não seria uma sociedade plenamente capitalista, devido ao predomínio da agricultura sobre a indústria na economia brasileira, por isso enquadrava-se muito mais na categoria de país semifeudal, que carecia ainda de uma revolução burguesa. Portanto, somente a superação do latifúndio e do imperialismo desbloquearia o desenvolvimento do capitalismo no Brasil, colocando com isso a revolução socialista na ordem do dia. Daí, a política do PCB, nos anos 1950-1960, ter se direcionado especialmente para a luta pela reforma agrária no país, que poria fim aos tais “restos feudais”.
Neste contexto, em que o PCB seguia a risca as orientações e os esquematismos propostos pela União Soviética, a atuação de Caio Prado Junior caracterizou-se por uma postura de autonomia intelectual e de dissidência política no interior do partido. Caio Prado discordava destas teses defendidas pelo PCB e procurou demonstrar a fragilidade delas em vários de seus trabalhos, como, por exemplo, em Formação do Brasil contemporâneo (1942) e A Revolução Brasileira (1966), nos quais se dedicou principalmente aos estudos históricos de onde retirava argumentos para o debate político.
De acordo com sua visão do processo de formação da sociedade brasileira, Caio Prado procurou demonstrar como que a colonização portuguesa era um capítulo da expansão comercial da burguesia europeia, por isso inevitavelmente ligada ao processo de formação da economia capitalista. Na verdade, a colonização foi um processo subordinado aos interesses da burguesia europeia, que estava em busca de produtos que pudessem ser comercializados com altos lucros no mercado mundial, objetivos que só podiam ser atingidos mediante um processo produtivo calcado num trabalhador altamente explorado, que não podiam ser senão um trabalho escravo.
Portanto, a formação do Brasil estaria submetida a uma dupla determinação: uma externa, caracterizada pela subordinação do país a economia mundial, e outra interna, advinda das relações escravistas de produção. Deste modo, Caio Prado Júnior fugia dos esquematismos advindos do stalinismo, para desenvolver uma reflexão voltada principalmente para a compreensão das particularidades da formação histórica do Brasil, com base na qual deveria se erigir uma estratégia para a revolução brasileira.






Refutando a teoria dos “restos feudais”, Caio Prado refuta também a política da “revolução democrático-burguesa”, defendendo, portanto, a atualidade da revolução socialista para a realidade brasileira. Daí que a luta política no Brasil deveria ser, segundo Caio Prado, não pela partilha da terra e sim onde “se encontram os pontos nevrálgicos do processo revolucionário em curso. A saber, a luta reivindicatória dos trabalhadores rurais por melhores condições de trabalho e emprego.” Para Caio Prado, a revolução brasileira tratava-se de generalizar os direitos trabalhistas para os trabalhadores rurais, de organizar sindicatos, enfim, via na luta direta pela terra uma questão residual, que não devia ser posta à frente de uma luta por reformas nas relações de trabalho, que terminasse, por assim dizer, a tarefa abolicionista, pondo fim a super exploração do trabalhador brasileiro. Observe, portanto, que para Caio Prado, não existem restos feudais no Brasil e sim uma herança da escravidão.
Por mais polêmicas que tenham sido as posições de Caio Prado, uma virtude o singulariza em relação a muitos: o seu marxismo tem uma profunda raiz na história nacional, pela interpretação do Brasil passavam todas as controvérsias que ele ofereceu ao pensamento comunista brasileiro por quase meio século, de modo que a própria ideia de política comunista é sempre pensada a partir da compreensão do conjunto da formação social brasileira em sua especificidade.
Entre os anos de 1955 e 1964, foi editor da Revista Brasiliense, onde desempenhou um importante papel na divulgação e renovação do ideário marxista-comunista no Brasil. Só para se ter uma ideia, foi nesta revista que apareceram as primeiras traduções de textos de Georg Lukács, Lucien Goldmann, Antonio Gramsci, entre outros autores dissidentes da ortodoxia stalinista.
Enfim, Caio Prado foi um intelectual militante que nunca se afastou do partido, procurando reunir teoria e prática em torno se sua luta no PCB. Sua obra tinha em vista servir à luta de classes e à revolução socialista no Brasil. A herança de Caio Prado Júnior para o pensamento comunista deve ser identificada na preocupação com especificidade da formação social brasileira e na importância da democracia para a política comunista.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Diálogos sobre Trabalho, Socialismo e Educação - Veja videos aqui!


Diálogos sobre Trabalho, Socialismo e Educação - Parte 1: Apresentação com Prof. Pablo Lima (UFMG)

Parte 1: http://www.youtube.com/watch?v=ily_Anrq6kg



Partes 2 e 3: Apresentação do trabalho de Filipe Raslan (Unicamp):

Parte 2: http://www.youtube.com/watch?v=ffTGCUlJN78

Parte 3: http://www.youtube.com/watch?v=oKz0XgClpbM


Partes 4 e 5: Apresentação do trabalho de Fernando Conde (UFMG):

Parte 4:  http://www.youtube.com/watch?v=96aCfO1JYgs



Parte 5: http://www.youtube.com/watch?v=m2AVDWP4_9s

domingo, 18 de setembro de 2011

REVISTA NOVOS TEMAS NÚMERO 04




Apresentação



A Revista Novos Temas traz, neste número, o seu primeiro dossiê que trata da questão da Comuna de Paris quando essa experiência de luta pelo poder, realizada pelos trabalhadores franceses, em especial pelos parisienses, faz 140 anos. Trata-se de um debate que tem motivado intelectuais e militantes marxistas na compreensão e aprofundamento do que representou a luta dos trabalhadores parisienses de 18 de março a 28 de maio de 1871. Foram 72 dias em que o futuro da humanidade esteve em disputa e os trabalhadores, que lutaram nas barricadas de Paris e que foram massacrados pelas tropas da contra-revolução, motivaram uma nova vaga revolucionária pós-primeira guerra mundial, com a Revolução Russa de 1917.



Neste dossiê, apresentamos, a partir da maturação do debate, da pesquisa e dos estudos, que, no decorrer do presente ano está movimentando os marxistas e revolucionários em encontrar pistas, conexões e perspectivas do que foi a Comuna de Paris, qual o seu legado histórico. Tem textos de intelectuais acadêmicos que tem grande envolvimento com a luta de classes em nosso país e que trouxeram para o debate recortes interpretativos que possibilitam entender a Comuna não como exemplo, mas como lição.



Publicamos os artigos dos professores João Quartim de Moraes, que discute as questões da Guerra Franco-prussiana, da revolução e da contra-revolução na França, em especial de 1870 a 1871, levando em considerações os antecedentes históricos, a posição de Marx e Engels sobre a Comuna e a reflexão sobre esse episódio histórico. Milton Pinheiro apresenta um debate sobre a Comuna de Paris a partir da Guerra, da instalação da dualidade de poder no decorrer dos episódios da Comuna e a discussão da possibilidade da transição que foi derrotada. O historiador Osvaldo Coggiola discorre sobre as relações da primeira internacional operária e a Comuna de Paris, utilizando-se dos clássicos para enfrentar esse debate. Mauro Iasi oferece um debate sobre a Comuna de Paris numa construção metafórica sobre as raízes terrenas da crítica ao céu. Paulo Barsotti trata da auto-emancipação dos trabalhadores e da necessidade da destruição do Estado. O Professor Antônio Carlos Mazzeo entra no debate de Lênin e a Comuna e, por fim, mas não por último, o cientista político e tradutor Luciano Martorano desenvolve a questão da socialização e Comuna no pensamento de Karl Korsch.



Esperamos, com esse número, contribuir para debater e aprofundar o acontecimento histórico que é considerado como a primeira revolução operária de nossos tempos, ao tempo em que homenageamos os trabalhadores, homens e mulheres que tombaram nas barricadas de Paris em defesa da humanidade. Aos comunardos que foram fuzilados no muro do cemitério Père-Lachaise, a bandeira vermelha que vocês levantaram continua sendo a bandeira da emancipação humana sob qual todos nós, marxistas e revolucionários lutamos.



Os Editores

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

José Paulo Netto assume a presidência do Instituto Caio Prado Jr.

O professor José Paulo Netto assumiu, na última semana, a presidência do Instituto Caio Prado Jr. (ICP), em evento realizado no Rio de Janeiro. “Estou muito gratificado pela indicação. Agradeço a confiança e afirmo que vou me doar, no limite de minhas possibilidades, para o ICP”, afirmou o intelectual comunista.



Doutor em Serviço Social, professor emérito da ESS da UFRJ e autor, entre outras publicações, de “Ditadura e Serviço Social - Uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64”, “Capitalismo Monopolista e Serviço Social”, “Crise do Socialismo e Ofensiva Neoliberal” e “Democracia e transição socialista”, José Paulo Netto é militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e assume a função no lugar de Antônio Carlos Mazzeo.



Sua nova responsabilidade coincide com um momento de intenso trabalho do Instituto, que acaba de lançar o primeiro número do “Cadernos do ICP”, Gramsci e o conceito de hegemonia, e prepara a publicação da quarta edição da revista Novos Temas. Aliás, a primeira medida anunciada em sua posse é o convite aos intelectuais Miguel Urbano Rodrigues (Portugal), Carlos Lozano Guillen (Colômbia) e Marcos Domich (Bolívia) para integrarem o conselho editorial da revista teórica marxista.



Em sua posse, José Paulo falou sobre a importância que o Instituto Caio Prado Jr. deve ter na formulação do ideário marxista em um momento de crise do capitalismo e crescente exploração sobre as classes trabalhadoras pelo mundo.



O ICP e os “Cadernos”



O Instituto Caio Prado Jr., que será dirigido pelo professor, é um centro de estudos e pesquisas cuja ênfase é a análise de questões políticas e filosóficas e dos problemas centrais do trabalho na sua contradição com o capital, dos movimentos sociais, da economia, da política e da história. Reúne professores, intelectuais, militantes sociais e pesquisadores de diversos matizes teórico-políticos dentro do espectro que se formou em torno do pensamento de Marx, Engels e demais filósofos do campo marxista. Em sua mais recente iniciativa, a entidade lançou a coleção Cadernos do ICP, publicação quadrimestral para a difusão de conteúdos normalmente tidos como herméticos à maioria dos trabalhadores e até mesmo militantes comunistas. O primeiro número, publicado na posse de José Paulo Netto, traz o texto “Gramsci e o conceito de hegemonia”, do historiador Ricardo Costa.



Além do primeiro número dos cadernos, o ICP lançou recentemente o livro "Caio Prado Junior: história e sociedade", que agrega os trabalhos apresentados no seminário sobre Caio Prado realizado em parceria com o CEMARX-Uneb, em outubro de 2010.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

REVISTA NOVOS TEMAS NÚMERO 03

A Novos Temas chega a seu terceiro número. O que pode parecer pouco para alguns é, na verdade, muito para uma revista que apesar de consolidada e vista como instrumento de debate vivo das questões centrais de nosso tempo pelos setores de vanguarda, ainda enfrenta problemas de todas as ordens. Por isso, é com orgulho de lutadores que apresentamos Novos Temas 03.





Neste número trazemos uma entrevista com um dos mais importantes filósofos marxistas da atualidade, Leandro Konder, que em 2010 recebeu Menção Honrosa do Prêmio Casa de las Américas por seu livro Memórias de um Intelectual Comunista. Nessa entrevista Konder fala de sua vasta e importante obra e aborda conceitos fundamentais da Teoria Social marxiana e da contribuição do filósofo húngaro György Lukács para o marxismo contemporâneo.







Na seção Fundamentos apresentamos o texto de Karl Marx, Crítica do Programa de Gotha, escrito em 1875 para o Congresso das organizações operárias, realizado entre os dias 22 e 27 de maio de 1875, na cidade alemã de Gotha, que tinha por objetivo fundar o Partido Socialista Operário Alemão. Esse texto ainda de grande importância e atualidade para a crítica do oportunismo e reformismo intrínseco à socialdemocracia, foi publicado por Friedrich Engels somente em 1981 em Neue Zeit.





Na seção Artigos, publicamos textos dos professores Marcos Cassin, sobre a construção do pensamento de Marx e Engls, enquanto corte epistemológico de rupturas e continuidades; Silvana Aparecida de Souza, que aborda a temática das novas formas de exploração do trabalho e Sílvio Luís de Almeida, que discorre sobre a essência do direito sob a ótica do Materialismo Dialético.





Na seção História Imediata, trazemos ao leitor um balanço provisório da crise da sociabilidade do capital, com três vigorosos artigos. Francisco José Soares Teixeira perfaz a trajetória da socialdemocracia em seus diversos momentos históricos, inclusive sua chegada ao Brasil, com o Partido dos Trabalhadores. Virgínia Fontes analisa a construção do que denomina Capital-Imperialismo, enquanto portador de juros, concentrador e expropriador do trabalho e dos recursos sociais. Jorge Beinstein discorre sobre os aspectos sociais da crise do capital, analisando o fim do crescimento global e suas conseqüências que hoje materializam-se na crise das periferias capitalistas e na crise nuclear gerada pelo tsunami no Japão.





Na seção Ideias em Movimento, Antonio Carlos Mazzeo resenha o livro do filósofo György Lukács, Chvostimus und dialektik, a partir de sua edição italiana, que poderia ser traduzido como “Reboquismo e Dialética”, ainda inédito no Brasil. Nesse livro, Lukács debate as críticas e reelabora conceitos de seu já clássico História e Consciência de Classes. Ricardo da Gama Rosa Costa resenha o livro de Virgínia Fontes, o Brasil e o Capital Imperialismo: teoria e História, que analisa o capitalismo contemporâneo, onde verifica-se a ampla expansão do capital monetário impondo novas formas de expropriação da força de trabalho e convertendo as atividades humanas em mercadorias e instrumentos de valor de troca.





Com esses materiais esperamos que o número 03 de Novos Temas continue a contribuir para a análise crítica e para o debate da realidade hodierna da sociabilidade do capital.





Os Editores

segunda-feira, 25 de julho de 2011

quinta-feira, 21 de julho de 2011

3 - NOVOS TEMAS – Revista do Instituto Caio Prado Jr - 3

Revista de Debate e Cultura Marxita

Número 03 – Junho de 2011

Entrevista – com Leandro Konder: Filósofo da dialética.

FUNDAMENTOS

Crítica ao programa de Gotha – Observações sobre o Programa do Partido Operário Alemão – Karl Marx

Louis Althusser e o corte epistemológico no pensamento de Karl Marx e Friedrich Engels – Marcos Cassin

Trabalho voluntário e responsabilidade social da empresa: novas formas de exploração da força de trabalho e de extração da mais-valia – Silvana Aparecida de Souza

A política da forma jurídica – Sílvio Luiz de Almeida

HISTÓRIA IMEDIATA

O capital na era da luta de classes disciplinada – Francisco José Soares Teixeira

O capital-imperialismo: algumas características – Virgínia Fontes

Ironias da crise: de Bengazi a Fukushima - Despolarização, fim do crescimento global, rebeliões periféricas, crises ideológicas – Jorge Beinstein

IDEIAS EM MOVIMENTO

Resenha – Chvostimus und Dialektik (Reboquismo e Dialética)

Livro inédito de György Lukács (Edição italiana, Coscienza di Classe e Etoria – Codismo e Dialettica, Roma, Edizioni Alegre, 207,166p.,posfácio de Slavoj Zizek) - Antônio Carlos Mazzeo

Resenha – FONTES, Virgínia. O Brasil e o capital imperialismo: teoria e história – Ricardo da Gama Rosa Costa

http://institutocaiopradojrmg.blogspot.com/

quinta-feira, 5 de maio de 2011

140 ANOS DA COMUNA DE PARIS


Seminário aberto ao público, realizado pela Faculdade de Educação da UFMG, o Instituto Caio Prado Jr., a Associação dos Geógrafos do Brasil, o DAFAE, PCB, PSoL, PSTU e o Forum Social Mineiro

Programação:

18/05/2011 - Local: Teatro da Cidade (R. da Bahia, 1341, Centro, Belo Horizonte, MG)
19:00hs - A Comuna de Paris de 1871 e a luta pelo socialismo
João Antônio de Paula - Faculdade de Ciências Econômicas UFMG
Milton Pinheiro - CEMARX Universidade do Estado da Bahia
Valério Arcary - CEFET São Paulo

19/05/2011 - Local: Arena Fafich - UFMG (Av. Antônio Carlos, 6627,  Pampulha, Belo Horizonte, MG)
11:00hs - Trabalho, educação e poder popular
Filipe Raslan - UNICAMP
Pablo Lima - Faculdade de Educação UFMG
Pedro Otoni - Fafich UFMG

19:00hs - A comuna e a atualidade do a luta pelo socialismo
Chico Alencar - Partido Socialismo e Liberdade PSoL
José Maria - Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado PSTU
Zuleide Faria de Melo - Partido Comunista Brasileiro PCB

segunda-feira, 25 de abril de 2011

O legado marxista e a luta politica na America Latina


Em primeiro lugar, agradecer o honroso e irrecusável convite para participar deste importante seminário, que se propõe a trazer o legado de Marx para colocá-lo a serviço da luta de classes, em especial na América Latina, e não apenas para uma discussão meramente acadêmica ou diletante.
A vasta obra de Marx e Engels é a principal contribuição para nós revolucionários entendermos a natureza do capitalismo e identificarmos os aliados e inimigos de classe do proletariado, levando em conta a conjuntura e a correlação de forças, em cada época, em cada país. Conhecendo nossos inimigos e aliados, à luz dos ensinamentos de Marx, podemos acertar mais do que errar, na luta para destruir o estado burguês e emancipar o proletariado.
Do ponto de vista da ação, das contradições do capitalismo e da luta política, podemos afirmar que o MANIFESTO DO PARTIDO COMUNISTA, que Marx compartilhou com Engels há 163 anos, continua tão atual quanto fundamental como contribuição aos partidos que lutam pela revolução socialista.
Marx está vivo quando se confirmam suas análises de que o capital extrapolaria seus limites nacionais, assumindo dimensão mundial e aumentando, quanto mais senil, suas tendências destrutivas frente à humanidade. Nunca foram tão expressivas e inconciliáveis as contradições entre a apropriação privada do capital e o caráter social da produção e portanto tão agudas as crises cíclicas de superprodução, agora com características estruturais, em que não se distinguem, temporalmente, ciclos, mas novas manifestações de uma mesma crise sistêmica. Trata-se de uma crise global, que Jorge Beinstein chama de crise da civilização burguesa, multifacética, em que os EUA estão no epicentro. Trata-se de uma crise do modo de produção capitalista.

A CRISE DO CAPITALISMO:
A crise sistêmica do capitalismo gera necessidades cada vez maiores de reprodução do capital. Disputas de mercados, escassez de fontes energéticas e recursos naturais atiçam as contradições inter-burguesas e empurram o imperialismo para novas aventuras militares. Estamos assistindo guerras imperialistas no Iraque e no Afeganistão, e agora na Líbia, e as tentativas de se abrirem novos focos de conflito, como no Irã, na Síria, na Coréia do Norte, além da continuidade da ocupação palestina.
Para tentar sair da crise, o capital saqueia os cofres públicos para salvar banqueiros e oligopólios; ataca os direitos sociais e trabalhistas, diminui a qualidade dos serviços públicos; aprofunda a exploração e a barbárie, a fome e a miséria. Para tal, recrudescerão a criminalização e a repressão aos movimentos sociais e às organizações populares e revolucionárias.
Esta crise, apesar de seus elementos estruturais, não é, por si só, a crise final do capitalismo, que não cairá de podre. Mas, dialeticamente, poderá criar as condições - com o provável acirramento da luta de classes em âmbito mundial – para colocar em relevo o protagonismo do proletariado e, a depender de certos fatores, influenciar positivamente a correlação de forças, abrindo possibilidades para o avanço da luta pela superação do capitalismo, na perspectiva do socialismo.
Apesar da diminuição relativa e gradual de sua hegemonia econômica, cultural, política e ideológica, os EUA ainda detêm a hegemonia militar inconteste, o que lhes permite continuar como o pólo mais importante num mundo cada vez mais multipolar, ainda que no campo capitalista. No caso da América Latina, o imperialismo norte-americano é altamente hegemônico e o inimigo principal dos povos da região. Reconhecer isto não significa alimentar ilusões de escolhermos outros imperialismos, como se as contradições entre eles fossem significativas. 
Os trabalhadores passaram as duas últimas décadas do século passado numa luta passiva, em função da avassaladora hegemonia do imperialismo, sobretudo o norte-americano. A desagregação da URSS teve um impacto arrasador, na medida em que deixou de ser um campo em que as forças progressistas e revolucionárias podiam obter apoio e que o mundo deixou de ser bipolar.
No entanto, os trabalhadores vêm aumentando a sua combatividade e os povos do Oriente Médio e do Norte da África se levantam contra tiranias, o imperialismo e o sionismo. Em várias partes, os trabalhadores retomam suas lutas e se colocam como vanguarda alternativa na luta de classes.
A CORRELAÇÃO DE FORÇAS NA AMÉRICA LATINA
A América Latina é uma das regiões do mundo em que a resistência retomou com mais força, apesar da heterogeneidade dos processos de mudança. Neste século, até por volta de 2008, as forças populares e anti-imperialistas contabilizavam mais avanços que retrocessos, sobretudo após a grande vitória do povo venezuelano, no fracassado golpe contra Chávez em 2002, talvez a primeira derrota golpista dos EUA na região.
Cuba não ficaria mais sozinha na luta contra o imperialismo. Sob a influência dos avanços na Venezuela, vieram as vitórias de Evo Morales, na Bolívia, e de Rafael Correa, no Equador.
Nesses três países, em que os processos de mudanças são os mais avançados, conseguiu-se, a partir de pressão popular, a convocação de Assembleias Constituintes livres e soberanas, que abriram espaços para avanços progressistas.
Num patamar intermediário, foram importantes neste período as vitórias da FSLN, na Nicarágua, e da FMLN, em El Salvador, e a manutenção da Frente Ampla no governo uruguaio.
Os governos dos Kirchner na Argentina, Michele Bachetel no Chile, Lula no Brasil e Lugo no Paraguai, com coligações heterogêneas, derrotaram forças reacionárias em seus respectivos países. No entanto, no nível macroeconômico e político, suas ações foram sempre no sentido de ampliar os interesses da burguesia de seus países, aumentando a presença e a exploração capitalista na região, contribuindo, assim, para uma afirmação burguesa no aparato de Estado.
As maiores vitórias desta fase foram o enterro da ALCA em Mar Del Plata, a reeleição de Chávez, a retirada da base norte-americana de Manta, no Equador, e a vitória de Evo Morales no referendo revogatório. A maior derrota foi o não no referendo constitucional na Venezuela, em dezembro de 2006. Todavia, é importante registrar o crescimento das lutas dos trabalhadores, dos grupos étnicos e da reafirmação da cultura originária em grande parte da América Latina.
O imperialismo estadunidense, percebendo que iam longe demais as mudanças onde considera seu quintal, retoma com intensidade a pressão sobre a região. Voltam-se, com intervenção política e aparato bélico, suas ações para a América Latina, sobretudo para a região andina. Trata-se de tentar, no plano tático, frear o processo de mudanças e, no estratégico, consolidar e expandir o controle sobre as riquezas naturais do continente, que são imensas. Além do petróleo e do gás, a América do Sul tem as maiores reservas de água potável e de biodiversidade do planeta: ao norte, a Amazônia; ao sul, o Aqüífero Guarani.
Uma das principais táticas utilizadas pelo inimigo foi estimular o separatismo, escolhendo cidades dominadas politicamente por setores burgueses de maior acumulação e que já têm rivalidades antigas com as capitais: Zulia (Venezuela), Santa Cruz de La Sierra (Bolívia) e Quaiaquil (Equador).
Não é à toa que a Quarta Frota da Marinha de Guerra dos EUA voltou a operar no nosso continente, após mais de 60 anos de inatividade.  
Marco importante desta ofensiva ianque foi o assassinato do Comandante Raul Reyes, pelo consórcio político/bélico representado pelos EUA/Colômbia, num ataque terrorista ao território do Equador, cujo Presidente não se acovardou e resolveu defender a soberania de seu país. Ali se tratava de paralisar as trocas humanitárias na Colômbia, que poderiam criar um clima favorável a uma negociação política a respeito do conflito armado.
A satanização da insurgência colombiana e a interrupção das trocas humanitárias, estas à época lideradas por Chávez e a Senadora Piedád Córdoba, criam as condições para a instalação de mais sete bases militares na Colômbia.
O golpe em Honduras é parte importante da luta contra o fortalecimento da ALBA e a recuperação, como aliado dos EUA, de um país que tem uma das maiores bases da América Central (Sotto Cano) e que se localiza estrategicamente entre a Nicarágua e El Salvador. Depois veio o aproveitamento do terremoto no Haiti e a cumplicidade do governo da Costa Rica, para o imperialismo instalar mais tropas nesses países. É parte deste esforço para estancar as mudanças e atingir a ALBA a recente tentativa de golpe no Equador.
No Paraguai, já sabíamos das dificuldades que teria Lugo, se efetivamente quisesse promover as mudanças prometidas. Foi eleito como expressão de um movimento de massas débil, na esperança de derrotar os conservadores que governavam o país havia 41 anos e ainda estão no poder. Tendo passado mais da metade de seu governo, o movimento de massas não teve forças para empurrar as mudanças e tudo indica que o Presidente se entregou à direita e ao imperialismo, aceitando um pacto com a classe dominante para não ser derrubado por um golpe. Lugo já não governa. Espera apenas acabar seu mandato.
OS PRINCIPAIS INIMIGOS DO IMPERIALISMO NA AMÉRICA LATINA
CUBA
Dificilmente teria avançado tanto o processo de mudanças na América Latina se não fora o exemplo da cinqüentenária Revolução Socialista de Cuba, que mostrou a possibilidade de as classes dominadas enfrentarem e derrotarem o imperialismo e escolherem seu próprio destino.
Na década de 90 do século passado, após o colapso da URSS, Cuba passou por dificuldades econômicas que exigiram o sacrifício do “período especial”, uma vez que mais de 80% do seu comércio dava-se com a URSS e o Leste Europeu. Novas medidas políticas e econômicas foram adotadas para enfrentar tal situação, no sentido de prosseguir com a efetivação do socialismo, apesar do agravamento do cruel bloqueio que hoje já dura mais de 50 anos.
O surgimento dos processos de mudança na América Latina, sobretudo o da Venezuela, deu um novo alento e respaldo à Revolução Cubana.
Claro está que o processo de construção do socialismo em Cuba é extremamente complexo e vive um momento de grandes dificuldades. O maior desafio do povo cubano é justamente manter firme a decisão de seguir construindo sua experiência de socialismo.
Tudo indica que as medidas propostas pelo governo refletem as necessidades geradas pelo processo histórico atual. Rejeitamos as análises que dão como inevitável em Cuba o retrocesso ao capitalismo, como querem fazer ver os ideólogos representantes da burguesia e do imperialismo, que por inúmeras vezes já anunciaram a morte do socialismo cubano. Ao mesmo tempo, consideramos justas as preocupações, no campo revolucionário, quanto aos riscos de se abrirem brechas para a incidência da mais-valia.
É imperioso seguirmos solidários ao povo, ao governo e ao Partido Comunista Cubano e ao caminho revolucionário que os cubanos escolheram e desenvolveram a partir de 1959. O povo cubano é quem melhor saberá dizer como enfrentar seus problemas e continuará encontrando, com a coragem, a obstinação e a criatividade que lhe são peculiares, as saídas para a manutenção e o aprofundamento das conquistas obtidas no processo de construção da sociedade socialista.
A luta pelo fim do bloqueio e pela libertação dos Cinco Heróis é parte da principal pauta dos revolucionários de todo o mundo.
VENEZUELA
A queda da Venezuela arrastaria inexoravelmente as esperanças dos povos da América Latina. Seu triunfo, entretanto, pode mudar o curso da história.” (Fidel Castro)
Além de Cuba, o governo venezuelano é hoje, em nosso continente, o principal inimigo do imperialismo, pela inspiração a processos semelhantes em outros países, aos quais presta efetiva solidariedade política e material; pela defesa de Cuba Socialista e parceria com ela; pela contribuição decisiva para inviabilizar a ALCA e implantar a ALBA; por ter avançado mais em mudanças institucionais e estruturais; por ter resistido a vários golpes; por ter criado uma mídia alternativa à burguesa; por ter as reservas minerais mais importantes da região andina e por ter uma relação superior de respeito aos interesses dos trabalhadores em sua marcha a caminho do socialismo.
Até dezembro de 2006, com a derrota no referendo constitucional, a revolução bolivariana tinha uma trajetória ascendente, com grandes vitórias, como o golpe midiático (2002), o lockout petroleiro (2003), o referendo revogatório (2004) e a reeleição de Chávez (2006).
A única derrota da revolução bolivariana teve como principal causa o erro de tentar decretar o socialismo através de um referendo de uma proposta de reforma constitucional, redigida previamente e apresentada pelo Presidente Chávez e não por subscrição popular, sem uma ampla discussão prévia entre as massas. Mas a derrota teve a virtude de colocar em evidência todos os problemas da revolução.
Mas apenas os erros táticos e a ação dos agentes do imperialismo não seriam capazes de derrotar o governo, que contava com quase dois terços do eleitorado. Metade dos eleitores do governo se absteve no referendo, dando vitória à direita. É a correta análise desta abstenção que pode ou não ajudar a retomada e o avanço da revolução, a depender do enfrentamento de problemas não resolvidos até hoje.
Saltam aos olhos as duas principais causas da abstenção: a traição de setores vacilantes, oportunistas e até contrarrevolucionários que gravitam em torno do governo e o recado de setores populares, insatisfeitos com os rumos e o ritmo da revolução bolivariana, o chamado voto castigo. Um quadro parecido, apesar de não tão dramático, se deu recentemente nas eleições parlamentares, em que a direita teve um desempenho acima da esperada, elegendo mais de 40% do parlamento.
A situação da luta de classes na Venezuela caminha para um confronto, que poderá resvalar para a violência, em face da notória impossibilidade de conciliação entre projetos tão antagônicos. Ao que tudo indica, este desempate se dará após a realização das eleições presidenciais, em 2012. Não será uma simples eleição a que estamos acostumados na democracia burguesa tradicional, no campo do chamado “jogo democrático”, da “alternância de poder”.
Se Chávez perder, não será para setores de esquerda, mas para a direita ligada e financiada pelo imperialismo, que revogará todos os avanços e acabará com a ALBA. A repercussão na América Latina (e no mundo) seria desastrosa, um retrocesso muito grande, sem qualquer comparação, por exemplo, com a derrota de Bachelet no Chile.
Por isso, contribuir para a vitória de Chávez será um desafio para toda a esquerda conseqüente da América Latina. Por mais que algumas forças de esquerda, como o PCB, tenham restrições a alguns aspectos da revolução bolivariana e não sejam chavistas, esta será uma das principais batalhas em 2012. Esperamos que o papel da classe trabalhadora na defesa de seu projeto seja o elemento central da vitória de Chávez.
Sem dúvida, nos doze anos de Revolução Bolivariana produziram-se grandes avanços, como melhores indicadores sociais a partir das diversas Misiones, a construção ainda que limitada de mecanismos de poder popular, a nacionalização da PDVSA e de alguns monopólios privados, o fortalecimento do papel do Estado no setor financeiro e na política monetária e cambial. Valorizamos também grandes avanços na consciência anti-imperialista e mesmo anticapitalista de amplas camadas populares.
São inegáveis as evidências de que o Presidente Chávez está honestamente convencido da necessidade de construir o socialismo, mesmo cercado por um entourage heterogêneo em que, ao lado de socialistas, pontificam contrarrevolucionários e corruptos. Têm um grande peso na direção do Estado setores da chamada “boli-burguesia” e fundamentalmente da pequena burguesia, que não têm interesse em mudanças revolucionárias.
Por isso, não podemos fechar os olhos a alguns fatores que podem levar a retrocessos e até mesmo à derrota do processo de mudanças, com a volta ao governo dos círculos direitistas associados ao imperialismo contribuindo para o massacre do projeto popular.
A economia venezuelana continua sendo basicamente petroleira, sem avanços na diversificação e na substituição de importações. Trata-se de um país basicamente importador, inclusive de alimentos, com alta dependência tecnológica.  Não têm sido desenvolvidas a contento, por outro lado, as iniciativas governamentais como as “empresas de produção social”, as cooperativas e pequenas empresas.  Nas novas empresas criadas pelo governo e naquelas que foram estatizadas, a participação dos trabalhadores é insuficiente e formal. Em algumas, a direção foi apropriada por gerentes corruptos e ineficientes. A não participação dos trabalhadores na gestão dessas empresas pode gerar um ciclo de “capitalismo de Estado”.
Em resumo, para avançar na perspectiva socialista, a atual fase, que o PCV define como “social-reformista, patriótica e progressista” só poderá ser superada por uma nova correlação de forças em que setores populares e revolucionários, liderados pela classe operária, alcancem um nível necessário de consciência, unidade, organização e mobilização que lhes permitam impor sua hegemonia.
BOLÍVIA
Na Bolívia, há um fator que tem dado boas condições de governabilidade ao governo popular. Evo foi eleito de baixo para cima, no contexto de grandes mobilizações, como as Guerras do Gás e da Água, que haviam derrubado três presidentes burgueses.
Com a vitória no referendo revogatório de agosto de 2008, evitou-se, pelo menos por agora, o separatismo de Santa Cruz e um golpe de direita que estava em curso. O Presidente saiu fortalecido, consagrado em meio ao seu mandato, em referendo convocado por ele próprio, com 67% dos votos, 14% a mais do que quando foi eleito em 2005. 
Mas é preciso ficar claro que quem derrotou o golpe e o separatismo foram as massas e que o processo não está imune a retrocessos, sobretudo se limitar-se aos aspectos culturais e democráticos, que são importantes, mas não decisivos na luta de classes.
Uma grande virtude do processo boliviano é a tradição de luta e de unidade da COB (Confederação Operária Boliviana).
EQUADOR
Como na Venezuela e na Bolívia, a mídia burguesa é o maior partido de oposição, coadjuvado pelas associações empresariais, partidos conservadores, a cúpula da igreja católica e ONGs financiadas pela USAID, sob a direção da embaixada norte-americana.
Rafael Correa, apesar de limitações, promoveu algumas mudanças. Começou com uma auditoria da dívida externa, que reconheceu apenas 30% do total até então cobrado pelos credores. A partir da pressão popular, efetivou-se uma Constituinte livre e soberana, independente do parlamento, propiciando uma nova constituição (promulgada em julho de 2008) avançada em termos de direitos sociais. Importantes medidas de Rafael Correa foram a determinação de retirada da base militar dos EUA e a integração de seu país à ALBA.
Correa também vem estatizando gradualmente a indústria petroleira, com a criação de um novo marco regulatório, em que o Equador retoma sua soberania sobre parte de suas riquezas e usufrui de seus rendimentos. Todavia, o governo Correa tem que sair do marco personalista, passando a agir em consonância com os trabalhadores do Equador, para que possa enfrentar o imperialismo e a burguesia e implementar uma saída progressista e popular.
BRASIL: A POLÍTICA EXTERNA PRAGMÁTICA
Na América Latina é difícil um comunista se dizer oposição a Lula e a Dilma. É compreensível. No imaginário da esquerda latino-americana, Lula é socialista e sua política externa parece anti-imperialista.
O Brasil é a oitava economia capitalista do mundo. No plano político, as lideranças burguesas dividem-se entre as que, de um lado, defendem um Estado promotor de políticas compensatórias e incentivador de um “desenvolvimentismo” capaz de acelerar o crescimento capitalista e pretensamente resolver as desigualdades sociais através do ciclo virtuoso da produção, emprego, consumo e aquelas que, de outro, defendem a ampliação das políticas neoliberais, com mais retirada de direitos dos trabalhadores, mais privatização, mais dependência ao capital financeiro internacional.
Os governos petistas representam os setores “desenvolvimentistas” da burguesia, que querem se expandir e competir no mercado externo, o que pressupõe algum grau de autonomia, não conflitiva, com os interesses norte-americanos.
Navegando entre as contradições interburguesas e interimperialistas, a política externa brasileira é coerentemente pragmática. Ao mesmo tempo em que aceita liderar as tropas da ONU que ocupam o Haiti, a pedido de Washington, ajuda Chávez a vencer o golpe petroleiro e Evo ao golpe separatista.
Com sua eficiente diplomacia, o capitalismo brasileiro vai ganhando mercados. Aos olhos de Washignton, Lula se apresentava como uma alternativa moderada ao “radicalismo” de Chávez e Evo Morales; aos olhos da esquerda latino-americana, se apresentava como aliado, mas que cobra um preço alto pela solidariedade: o aproveitamento de oportunidades na busca de mercados. E é o estado brasileiro, principalmente através de bancos públicos, que alavanca as grandes empreiteiras e monopólios multinacionais de origem brasileira a invadirem e crescerem em várias partes do mundo, sobretudo na América Latina.
Quando o governo brasileiro ajuda a inviabilizar a ALCA ou lidera a criação da UNASUL (União das Nações Sul-Americanas) devemos saudá-lo, pois isto objetivamente contraria os interesses dos EUA. Mas não esqueçamos o outro lado da questão: o Brasil é um contraponto capitalista ao movimento de integração anti-imperialista da região, representado pela ALBA.
A esquerda não pode conciliar e deixar de marcar diferenças com Lula e Dilma, que governam fundamentalmente para o capital, tanto na política externa como na interna. A tarefa principal dos governos petistas é “destravar” o capitalismo, custe o que custar, depredando o meio ambiente e reduzindo os direitos trabalhistas, inclusive com a cooptação de setores do movimento sindical e popular. Aliás, o governo Lula jogou papel importante para cooptar e degenerar a CUT, uma central que já foi combativa, afastando da luta anticapitalista e anti-imperialista na América Latina um enorme  contingente de trabalhadores.
Com Dilma, a política externa ainda tende a uma inflexão, cujos sinais são as críticas ao Irã, as mudanças nos quadros dirigentes do Ministério de Relações Exteriores, a abstenção cúmplice na agressão imperialista à Líbia e, sobretudo, a vergonhosa recente visita de Obama ao Brasil.
A vinda do presidente dos EUA ao Brasil foi um gesto forte que marcou um claro movimento de estreitamento das relações entre os dois países. Obama foi o primeiro estadista estrangeiro a visitar o Brasil após a posse de Dilma. Mas não foi uma visita qualquer.
O governo brasileiro montou um palanque de honra para Obama falar ao mundo, em especial à América Latina, para ajudar os EUA a recuperarem sua influência política e reduzir o justo sentimento antiamericano que nutre a maioria dos povos. Nem na ditadura militar, um presidente estadunidense teve uma recepção tão espalhafatosa como a que Dilma lhe ofereceu.
Em verdade, o Brasil esteve três dias sob intervenção do governo ianque, que decidiu tudo sobre a passagem de Obama pelo país. Passamos pelo vexame de agentes da CIA revistarem Ministros de Estado brasileiros, em eventos da visita.
No caso da América Latina, foi um gesto de solidariedade aos EUA em sua luta contra os processos de mudança, sobretudo na Venezuela, Bolívia e no Equador.
A moeda de troca foi um mero aceno norte-americano à pretensão obsessiva do Estado burguês brasileiro de ocupar uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, um símbolo para elevar o Brasil à categoria de potência capitalista mundial.
Enganam-se os que pensam que existe contradição entre a política externa do governo Lula e a de Dilma, ambas fundamentalmente a serviço do capital. Trata-se agora de uma inflexão pragmática. Após uma fase em que o Brasil expandiu e consolidou seus interesses comerciais em novos “mercados” como América Latina, África, Ásia e Oriente Médio, a tarefa principal agora é dar mais atenção aos maiores mercados do mundo, para cuja disputa segmentos da burguesia brasileira se sentem mais preparados.
O governo brasileiro, durante os três dias em que Obama presidiu de fato o Brasil, não fez qualquer gesto ou apelo aos EUA, sequer de caráter humanitário, pelo fim do bloqueio a Cuba, o desmonte do centro de tortura em Guantánamo, a criação do Estado Palestino, o fim da intervenção militar no Iraque e no Afeganistão.
Debochando da soberania brasileira, Obama ordenou os ataques militares contra a Líbia a partir do território brasileiro.
Os principais objetivos da vinda de Obama ao Brasil foram as reservas petrolíferas do pré-sal e a licitação para a compra de aviões militares.
Cada vez fica mais claro que, no caso brasileiro, o imperialismo não é apenas um inimigo externo a combater, mas um inimigo também interno, que se entrelaçou com os setores hegemônicos da burguesia brasileira. O pacto Obama/Dilma reforça o papel do Brasil como ator coadjuvante e sócio minoritário dos interesses do imperialismo norte-americano na América Latina, como tristemente já indicava a vergonhosa liderança brasileira das tropas militares de intervenção no Haiti.
COLÔMBIA: OUTRA GRANDE DISPUTA!
O imperialismo sabe que não haverá paz na Colômbia e, quem sabe, na América Latina, sem o reconhecimento do caráter beligerante e político das FARC. Sabe também que a solução não poderá ser estritamente militar, pois o conflito colombiano é antes de tudo político, econômico e social.
O imperialismo também precisa derrotar a insurgência, para que não sirva de exemplo. Não podemos esquecer que não são convencionais, mas insurgentes, as forças que resistem ao imperialismo na Palestina, no Iraque e no Afeganistão. Forças armadas convencionais não resistem aos ataques aéreos das grandes potências imperialistas. Dependendo dos desdobramentos da crise do capitalismo, nenhuma forma de luta poderá ser descartada. O direito dos povos à rebelião poderá se transformar em dever.
Mas como é difícil vencer a insurgência militarmente, não só pelo aspecto bélico como também por seu histórico enraizamento no povo colombiano, o imperialismo a sataniza como “narcoterrorista”, tentando isolá-la, inclusive de setores reformistas da esquerda latino-americana, preocupados com a sua votação na próxima eleição.
Mas se não pode derrotar a guerrilha, não interessa ao imperialismo o fim do conflito colombiano, para justificar a luta “contra o narcoterrorismo”, que usa como pretexto para criar mais bases na Colômbia e arredores. A Colômbia está para a América Latina como Israel para o Oriente Médio. É um dos principais receptores de ajuda militar norte-americana. E as FARC não podem entregar suas armas e descer as montanhas, sob pena de um novo extermínio, como nos anos 90, em que 5.000 militantes da União Patriótica foram assassinados pelo estado colombiano, após a assinatura de um “acordo de paz” com a guerrilha para que esta se transformasse num partido político legal!
Para forçar o estado colombiano a reconhecer o conteúdo político, econômico e social do conflito, devemos lutar muito para que a UNASUL chame para si a iniciativa de viabilizar o início de um processo de negociação política, para a qual a liderança do Brasil é fundamental.
As FARC são um fator de resistência à ocupação imperialista da Colômbia e, porque não dizer, da Amazônia.
Para avançar nas mudanças sociais na América Latina e evitar guerras e retrocessos, além da necessidade decisiva de elevar o empenho e a organização dos trabalhadores na luta de classes, há uma tarefa importante: derrotar o principal braço do imperialismo norte-americano em nosso continente, o estado terrorista da Colômbia.
REFORMA OU REVOLUÇÃO?
A crise deveria enterrar as ilusões dos que ainda consideram possível humanizar o capitalismo. Não há mais, como na época de ouro da socialdemocracia, anéis para a burguesia dar aos trabalhadores para não perder os dedos. Aliás, no final do século passado ela já os havia tomado de volta, aproveitando-se da queda da União Soviética. É parte importante das tarefas dos revolucionários o combate sem trégua e conciliação aos reformistas, tão bem definidos por Eustoquio Contreras, em seu livro "Princípios e Valores do Processo Revolucionário":
"O reformismo é uma corrente político-partidária favorável a mudanças graduais e não acredita em mudanças revolucionárias. Ideologicamente os reformistas são  pessoas comprometidas com determinados interesses, aos quais defendem diante da possibilidade de serem afetados por qualquer mudança radical. Os reformistas se esforçam para conter as lutas revolucionárias aplicando uma artificial política  de conciliação entre as classes com interesses opostos. O reformista colaborara com a burguesia na implementação de reformas parciais, que não afetam os seus interesses de classe, enquanto enganam as classes exploradas com a promessa de reformas, que irão gradualmente resolver os problemas dos oprimidos e explorados."
Marx, na obra O 18 Brumário de Luís Bonaparte, já afirmava que o “caráter peculiar da social-democracia resume-se no fato de exigir instituições democrático-republicanas como meio não de acabar com dois extremos, capital e trabalho assalariado, mas de enfraquecer seu antagonismo e transformá-lo em harmonia”. Segundo Marx, a social-democracia surge na Europa visando promover a transformação da sociedade por um processo democrático, porém, uma transformação dentro dos limites da pequena burguesia.

Não há também mais espaço, no capitalismo cada vez mais globalizado, para ilusões nacional-desenvolvimentistas ou nacional-libertadoras, baseadas em alianças dos trabalhadores com as chamadas burguesias nacionais. Mesmo nos países em que o desenvolvimento das forças produtivas se processa em ritmos mais lentos que nas nações de capitalismo avançado, as contradições de setores minoritários das burguesias nacionais com o imperialismo são residuais, até porque dependem cada vez mais do grande capital e dos monopólios.

Na fase imperialista do capitalismo, ainda mais em meio à sua maior crise, a hegemonia no Estado burguês pertence aos segmentos associados aos grandes monopólios. Quem manda são os grandes capitalistas ligados aos bancos, agronegócio, exportadores de matéria prima, grandes indústrias.

Cada vez mais se acentuará no mundo a contradição entre o capital e o trabalho. Não apenas nos países desenvolvidos ou emergentes, como é o caso do Brasil, plenamente associado de forma subordinada ao imperialismo. É só olhar para países pouco desenvolvidos, como a Bolívia e a Venezuela, para entender a ilusão de alianças com as burguesias nacionais. Vejam a violência da burguesia boliviana, diante de uma revolução que não é socialista, mas ainda democrática e cultural, e o ódio que nutre a burguesia venezuelana frente à revolução bolivariana. 
No estágio atual do capitalismo, e sobretudo em decorrência de sua profunda crise, se evidenciará cada vez mais a centralidade do trabalho. Estão sendo jogados no lixo da história todos os mitos construídos pelo neoliberalismo, como o “estado mínimo”, o “livre-mercado” e o “fim da classe operária”.
Ao contrário do que dizem os profetas do fim da história e os reformistas, o proletariado aumenta no mundo, em quantidade e qualidade. As camadas médias se proletarizam. Em todas as partes, sobretudo nos países desenvolvidos, apesar da atual fragilidade e fragmentação do movimento operário e sindical, há grandes possibilidades de a luta de classes se intensificar.
Outra ilusão reformista a ser combatida é a ilusão de transição ao socialismo apenas pela via institucional.
Marx, inspirado na rica experiência da Comuna de Paris, chamava a atenção para a impossibilidade de uma transição revolucionária sem a hegemonia político-militar do proletariado, um poder popular verdadeiramente democrático com o objetivo de varrer as instituições do estado burguês e a hegemonia das classes dominantes.
A tomada do poder político por parte da maioria do povo nunca foi nem será uma concessão generosa das classes dominantes. O sistema de exploração que funde os interesses das chamadas burguesias nacionais com os do imperialismo não “cai de podre” nem pelo passar do tempo. Os exploradores não entregam voluntariamente o poder aos explorados, nem mesmo quando setores representativos destes últimos ganham uma eleição, nos marcos da democracia burguesa. Às vezes, são obrigados, a contragosto, a entregar o governo a setores populares, mas estes só alcançarão o poder com lutas muito duras, acumulando forças e golpeando o estado burguês, utilizando-se de métodos e formas de luta as mais variadas (institucionais e insurgentes), adaptadas às circunstâncias, tendo principalmente em conta a correlação de forças entre as classes em luta.
Seja qual for a via da conquista do poder, o caminho ao socialismo só pode ser pavimentado na mobilização e ação das massas exploradas, sob a direção de uma vanguarda revolucionária.
É fundamental, portanto, a luta sem tréguas contra todas as formas de reformismo, como as teorizações sobre os “novos sujeitos”, o “movimentismo” (cujo maior exemplo é o Fórum Social Mundial), marcado pela aversão à política e aos partidos e pelo privilégio de atuação em ONGs e movimentos sociais os quais, em que pese o fato de alguns deles levantarem bandeiras justas, não compreendem a necessidade da luta global pela superação do capitalismo.
Não é nunca demais lembrar a passagem de Marx e Engels, no Manifesto do Partido Comunista:
“Os comunistas não se rebaixam a dissimular suas opiniões e seus fins. Proclamam abertamente que seus objetivos só podem ser alcançados pela derrubada violenta de toda a ordem social existente”.
DE QUE SOCIALISMO FALAMOS?
A continuidade e o avanço do atual processo de transformações na América Latina e a possibilidade de ele vir a assumir um caráter socialista vão depender principalmente da correlação de forças, do nível de consciência, unidade, organização e mobilização das massas populares.
É correto os revolucionários participarem dos processos de mudanças que se dão em países como Venezuela, Bolívia e Equador, desde que mantenham autonomia e visão crítica, combinando unidade e luta.  Para isto, é preciso que os comunistas deixem claro, nesses países, as limitações de conceitos de socialismo tais como “bolivariano”, “cidadão”, “do século XXI”, do “bom viver”.
Na Ideologia Alemã e no Manifesto do Partido Comunista, Marx duela com as adjetivações do socialismo, todas elas de conteúdo reformista.
Estes adjetivos podem até se adaptar à atual fase dos processos revolucionários nesses países, mas não ao socialismo. Até porque em Nossa América, com exceção de Cuba, não há ainda qualquer revolução socialista em curso, mas importantes processos de mudanças, que podemos caracterizar como revoluções nacionais e democráticas.
É necessário relermos os conceitos que nos legaram Marx, Lenin e outros pensadores a respeito do socialismo, para reafirmá-los e os adaptarmos ao mundo contemporâneo. Estes conceitos não foram negados na derrota da experiência de construção do socialismo na União Soviética e outros países do Leste Europeu. Pelo contrário, continuam atuais. Apesar de o saldo da Revolução Russa ter sido positivo, ali foram ignorados ou deturpados vários destes princípios, sobretudo aqueles relativos à democracia operária, que levaram à hipertrofia e ao esclerosamento do Partido e sua fusão (e confusão) com o Estado e as organizações de massa.
Portanto, não se trata de inventarmos “novos” socialismos, como se fosse possível conjugar elementos do socialismo e do capitalismo. Este é um terreno pantanoso, em que se adjetivam o substantivo socialismo até como “moderno” ou “democrático”, como se fosse velho ou antidemocrático.
E não haverá revolução socialista se não se começar a desconstruir o estado burguês e os poderes de fato constituídos pela mídia hegemônica, o aparato policial militar, a justiça. E a transição ao socialismo só será assegurada pela instauração do Poder Popular – a democracia direta e protagônica das massas – e o estabelecimento de novas relações de produção, com a supressão da exploração do homem pelo homem.
Mas não podemos cair no voluntarismo, deixando de reconhecer as dificuldades por que passam os processos de mudanças na América do Sul. A primeira coisa é reconhecermos que ainda não estamos, objetiva e subjetivamente, em situações pré-revolucionárias. Segundo Marx, a revolução não se dá da noite para o dia e não depende apenas de vontade. É um processo com duração de difícil previsão e não linear, sujeito a retrocessos. .
Esses processos estão atingindo um ponto crucial, que está chegando mais cedo na Venezuela, mas não tardará a chegar na Bolívia e no Equador. Trata-se de um momento de inflexão, em que se apresenta a dicotomia reforma ou revolução.
Há uma certa fadiga nas massas exploradas, pois as mudanças não chegam às relações entre capital e trabalho. Os trabalhadores são portadores de direitos formalizados na constituição e usufruem da melhoria dos serviços públicos, mas não sentem qualquer mudança mais significativa em suas condições de vida e na distribuição de renda.
Essa é uma limitação de revoluções nacionais e democráticas hegemonizadas por setores da pequena e média burguesia e não pelo proletariado; portanto, reformistas. A maior virtude de processos como estes é que tornam evidente a luta de classes, contrapondo os interesses do capital aos do proletariado, dos trabalhadores e de setores das camadas médias. Isto não ocorre em processos mitigados, de conciliação de classe, como no Brasil, em que os governos e os partidos ditos de esquerda que lhes apóiam não mobilizam as massas e não enfrentam ideologicamente o capitalismo.
A maior debilidade desses processos é a falta de instrumentos políticos e organizações de massas que impulsionem as mudanças no sentido da revolução permanente, verdadeiramente socialista, que vá na direção da constituição do duplo poder e da ruptura com o estado burguês.

Ivan Pinheiro - Secretário Geral do PCB (Partido Comunista Brasileiro)
Palestra em seminário sobre Marx, em Maracay (Venezuela), organizado pela Prefeitura de Girardot, a Frente Alfredo Maneiro e o Movimento Continental Bolivariano.